A Noiva (patricia Moreira), entregou-me uma cópia da última página do seu diário, onde se encontra uma carta que ela nunca teve coragem de entregar a Leonardo. Isto antes de queimar todo o diário...
Almería, 23 de Julho de 1928
Amanhã, finalmente, tudo irá acabar. Este sufoco, esta maldita aflição, já lhe vejo o fim. Amanhã por esta hora, já estarei casada. O namoro de três anos, tem as horas contadas, e aquele momento que tanto receei, e desejei ao mesmo tempo, está prestes a acontecer.
Este namoro, ao contrário do anterior, conseguirá cumprir o seu objectivo. Não será travado por nada, nem por ninguém, afinal de contas, um moço como ele, a todos deve agradar. Meu pai, não pensa noutra coisa. Minhas amigas, bombardeiam-me com perguntas sem fim, às quais eu não sei, nem quero responder. Todos parecem entusiasmados, e ansiosos pelas bodas de amanhã.
E eu estou aqui, petrificada sem saber o que pensar, sem saber como agir. Será que o convite já chegou a casa de minha prima? Com certeza que sim. Como terá ficado ele quando soube? Não quero saber, mais nada! Amo-o e tenho medo de o amar. Casou-se com minha prima, logo que eu, por imposição de meu pai, lhe fui negada. E eu fui ao seu casamento... eu estava lá sentada, a vê-lo casar com outra mulher, a ver o meu lugar ocupado por outrem. Nem uma lágrima verti. Nem quando me fitou com o seu olhar, tão rico, e que tanto me dizia. Não devo pensar mais nestas coisas, afinal de contas, já tem um menino, e outro vem a caminho. Mas tal momento não me sai da memória, nem esse, nem a doce recordação dos tempos de namoro. Como eu era ingénua! Pensava que era possível uma mulher amar um homem, casar-se, ter filhos, e ser feliz com ele sempre a seu lado. Ignorava o que via em casa. Ignorava a tristeza e a frieza de minha mãe quando meu pai fitava. Lembro-me em pequenina, quando um dia me dirigi para a cozinha, onde as criadas se encontravam a amaçar o pão, de ouvir pela boca de minha angústia de se ter casado com meu pai. Meu avô matou o seu grande amor, quando soube que ambos namoravam, e obrigou-a a casar-se com meu pai. Há quem diga que ela morreu da vontade de morrer. Meu pai diz que herdei o olhar de minha mãe, que é profundo e sincero. Se assim é... tenho medo dele. Tenho medo de com o passar dos anos, o carinho que sinto por meu noivo se desfaça, e dê lugar ao seu olhar... aquele que ela fazia quando meu pai mirava.
Não sei se irei aguentar. Três anos já passaram, e não houve um único dia, um único momento que dele não me lembrasse. O ser cheiro não me sai da cabeça, sinto-o agora aqui sozinha a escrever, como se ele estivesse aqui ao meu lado, a sorrir para mim, como tantas vezes costumava fazer. Não sei se ainda pensa em mim. Agora, a sua presença tortura-me. O facto de ali estar inquieta o meu olhar, e tenta-o a contemplar a sua beleza. Distracção é algo que não posso ter, caso contrário, o meu maldito olhar dele não despega. O desejo de o tocar, de o ver, quase me enlouqueceu. Ai minha terra, alimenta-me imploro-te, alimenta o meu sangue, e impede que ele me entregue à loucura. Não posso mais ouvir os seus gritos.
“Estás tão perto amor, e ao mesmo tempo tão longe. Tudo me impede de te tocar, tudo me impede de ser feliz a teu lado. Maldito mundo este, maldito!
Sabes, de inicio tentei mudar a minha sorte, tentei lutar contra meu pai, contra todos aqueles que tudo fizeram para nos separar. Mas não consegui, eles foram mais fortes. Mas claro tu, nada sabes desta minha luta. Pensas que aceitei tudo de cabeça no chão, como uma rapariga obediente deve fazer. Não! Mas também não to quis dizer. Quis testar o teu amor por mim, quis ver até que ponto por mim lutavas. Não me julgues, jamais!
Diz-me, que pode uma rapariga fazer contra a vontade de seu pai? Nada, apesar do meu esforço para me soltar da rede em que ele e as circunstâncias me enrolaram, apesar de ter chorado noites e noites contra a minha almofada, apesar de ter implorado... de nada valeu! Mas isso não foi o mais difícil. Por muito que te impressione.
Desisti de lutar por ti, desisti de viver. Entreguei-me ao olhar de minha mãe e de lá nunca mais saí. Ele apoderou-se de mim. Aquele olhar triste, conformado, cansado de tanto sofrimento. Então, decidi que não iria mais contrariar a vontade de meu pai. Iria sim, iniciar uma batalha bem mais difícil, bem mais dura, bem mais mortal.
E foi assim que decidi focalizar as minhas forças, no objectivo de te apagar da minha memória, a ti e a todas as recordações. Pensei que morria, pensei que desistia de viver ao renunciar a algo que se tornou a minha razão de viver, a minha alegria, o meu flamengo! Sim, tu eras tudo isso, o calor, a dança, a paixão; a terra, que todos dos dias toco, cheiro, sinto, cuido e que me dá os filhos que nela plantei. Era esta terra, que me aliviava a dor, porque te sentia nela. Porque ela está em mim, porque ela é o que eu sou.
Mas agora vou casar. Agora, vão me arrancar a minha terra que eu tanto amo, vão envenená-la porque ela não será só minha. Por ela correrá um rio, que embora puro, irá apodrecer e ferir toda a minha plantação! Vão te arrancar de mim amor, de uma forma cruel e dura de aceitar, assim como aconteceu à três anos atrás.
Penso que finalmente, compreendo o olhar de minha mãe. Pobre mulher! Apunhalava meu pai, a cada olhar que lhe lançava. E agora, vejo-me rendida a esse olhar, do qual tanto tempo fugi, tanto tempo desprezei. Nem sabes o quanto te respeito, o quanto te entendo, madre. Sou uma prisioneira, tal como tu. Morrerei de loucura, tal como tu, por não querer ouvir a voz do meu sangue, a voz da minha terra.
Selo aqui e agora tudo o que se passou. Casaste-te, e agora casar-me-ei eu, com a mesma força, o mesmo orgulho, a mesma frieza, com que tu te entregas-te a minha prima.
Nunca ponhas em causa o meu amor, nunca duvides da minha paixão, nunca de esqueças que és a minha terra, nunca me apagues da tua memória. Talvez assim, me seja mais fácil viver. Fico feliz, e fico quieta para que tudo isso possa ser verdade. Porque ao contrário do que aconteceu a minha mãe, tu estás vivo. Meu pai não te matou. E isso basta por agora, a certeza da tua existência basta para não esquecer que meu coração ainda bate, e que meu sangue ainda corre... por detrás do olhar de minha mãe.”
Prometi para mim mesma, que quando me casasse, este diário, que escrevo à três anos, iria ser queimado, e enterrado na minha terra. É lá que ele deve ficar, é lá que ele pertence. Talvez assim, a minha terra não fique tão envenenada, e me dê forças para lutar contra tudo isto que sempre aceitei.
Estarei a enterrar o meu amor, ou a plantar a esperança? Não sei, mas é uma forma de sobrevivência.
Fin
Amanhã, finalmente, tudo irá acabar. Este sufoco, esta maldita aflição, já lhe vejo o fim. Amanhã por esta hora, já estarei casada. O namoro de três anos, tem as horas contadas, e aquele momento que tanto receei, e desejei ao mesmo tempo, está prestes a acontecer.
Este namoro, ao contrário do anterior, conseguirá cumprir o seu objectivo. Não será travado por nada, nem por ninguém, afinal de contas, um moço como ele, a todos deve agradar. Meu pai, não pensa noutra coisa. Minhas amigas, bombardeiam-me com perguntas sem fim, às quais eu não sei, nem quero responder. Todos parecem entusiasmados, e ansiosos pelas bodas de amanhã.
E eu estou aqui, petrificada sem saber o que pensar, sem saber como agir. Será que o convite já chegou a casa de minha prima? Com certeza que sim. Como terá ficado ele quando soube? Não quero saber, mais nada! Amo-o e tenho medo de o amar. Casou-se com minha prima, logo que eu, por imposição de meu pai, lhe fui negada. E eu fui ao seu casamento... eu estava lá sentada, a vê-lo casar com outra mulher, a ver o meu lugar ocupado por outrem. Nem uma lágrima verti. Nem quando me fitou com o seu olhar, tão rico, e que tanto me dizia. Não devo pensar mais nestas coisas, afinal de contas, já tem um menino, e outro vem a caminho. Mas tal momento não me sai da memória, nem esse, nem a doce recordação dos tempos de namoro. Como eu era ingénua! Pensava que era possível uma mulher amar um homem, casar-se, ter filhos, e ser feliz com ele sempre a seu lado. Ignorava o que via em casa. Ignorava a tristeza e a frieza de minha mãe quando meu pai fitava. Lembro-me em pequenina, quando um dia me dirigi para a cozinha, onde as criadas se encontravam a amaçar o pão, de ouvir pela boca de minha angústia de se ter casado com meu pai. Meu avô matou o seu grande amor, quando soube que ambos namoravam, e obrigou-a a casar-se com meu pai. Há quem diga que ela morreu da vontade de morrer. Meu pai diz que herdei o olhar de minha mãe, que é profundo e sincero. Se assim é... tenho medo dele. Tenho medo de com o passar dos anos, o carinho que sinto por meu noivo se desfaça, e dê lugar ao seu olhar... aquele que ela fazia quando meu pai mirava.
Não sei se irei aguentar. Três anos já passaram, e não houve um único dia, um único momento que dele não me lembrasse. O ser cheiro não me sai da cabeça, sinto-o agora aqui sozinha a escrever, como se ele estivesse aqui ao meu lado, a sorrir para mim, como tantas vezes costumava fazer. Não sei se ainda pensa em mim. Agora, a sua presença tortura-me. O facto de ali estar inquieta o meu olhar, e tenta-o a contemplar a sua beleza. Distracção é algo que não posso ter, caso contrário, o meu maldito olhar dele não despega. O desejo de o tocar, de o ver, quase me enlouqueceu. Ai minha terra, alimenta-me imploro-te, alimenta o meu sangue, e impede que ele me entregue à loucura. Não posso mais ouvir os seus gritos.
“Estás tão perto amor, e ao mesmo tempo tão longe. Tudo me impede de te tocar, tudo me impede de ser feliz a teu lado. Maldito mundo este, maldito!
Sabes, de inicio tentei mudar a minha sorte, tentei lutar contra meu pai, contra todos aqueles que tudo fizeram para nos separar. Mas não consegui, eles foram mais fortes. Mas claro tu, nada sabes desta minha luta. Pensas que aceitei tudo de cabeça no chão, como uma rapariga obediente deve fazer. Não! Mas também não to quis dizer. Quis testar o teu amor por mim, quis ver até que ponto por mim lutavas. Não me julgues, jamais!
Diz-me, que pode uma rapariga fazer contra a vontade de seu pai? Nada, apesar do meu esforço para me soltar da rede em que ele e as circunstâncias me enrolaram, apesar de ter chorado noites e noites contra a minha almofada, apesar de ter implorado... de nada valeu! Mas isso não foi o mais difícil. Por muito que te impressione.
Desisti de lutar por ti, desisti de viver. Entreguei-me ao olhar de minha mãe e de lá nunca mais saí. Ele apoderou-se de mim. Aquele olhar triste, conformado, cansado de tanto sofrimento. Então, decidi que não iria mais contrariar a vontade de meu pai. Iria sim, iniciar uma batalha bem mais difícil, bem mais dura, bem mais mortal.
E foi assim que decidi focalizar as minhas forças, no objectivo de te apagar da minha memória, a ti e a todas as recordações. Pensei que morria, pensei que desistia de viver ao renunciar a algo que se tornou a minha razão de viver, a minha alegria, o meu flamengo! Sim, tu eras tudo isso, o calor, a dança, a paixão; a terra, que todos dos dias toco, cheiro, sinto, cuido e que me dá os filhos que nela plantei. Era esta terra, que me aliviava a dor, porque te sentia nela. Porque ela está em mim, porque ela é o que eu sou.
Mas agora vou casar. Agora, vão me arrancar a minha terra que eu tanto amo, vão envenená-la porque ela não será só minha. Por ela correrá um rio, que embora puro, irá apodrecer e ferir toda a minha plantação! Vão te arrancar de mim amor, de uma forma cruel e dura de aceitar, assim como aconteceu à três anos atrás.
Penso que finalmente, compreendo o olhar de minha mãe. Pobre mulher! Apunhalava meu pai, a cada olhar que lhe lançava. E agora, vejo-me rendida a esse olhar, do qual tanto tempo fugi, tanto tempo desprezei. Nem sabes o quanto te respeito, o quanto te entendo, madre. Sou uma prisioneira, tal como tu. Morrerei de loucura, tal como tu, por não querer ouvir a voz do meu sangue, a voz da minha terra.
Selo aqui e agora tudo o que se passou. Casaste-te, e agora casar-me-ei eu, com a mesma força, o mesmo orgulho, a mesma frieza, com que tu te entregas-te a minha prima.
Nunca ponhas em causa o meu amor, nunca duvides da minha paixão, nunca de esqueças que és a minha terra, nunca me apagues da tua memória. Talvez assim, me seja mais fácil viver. Fico feliz, e fico quieta para que tudo isso possa ser verdade. Porque ao contrário do que aconteceu a minha mãe, tu estás vivo. Meu pai não te matou. E isso basta por agora, a certeza da tua existência basta para não esquecer que meu coração ainda bate, e que meu sangue ainda corre... por detrás do olhar de minha mãe.”
Prometi para mim mesma, que quando me casasse, este diário, que escrevo à três anos, iria ser queimado, e enterrado na minha terra. É lá que ele deve ficar, é lá que ele pertence. Talvez assim, a minha terra não fique tão envenenada, e me dê forças para lutar contra tudo isto que sempre aceitei.
Estarei a enterrar o meu amor, ou a plantar a esperança? Não sei, mas é uma forma de sobrevivência.
Fin
9 comentários:
minha querida e adorada prima, sabes como gosto de ti... mas ainda gosto mais do meu marido. sofro quando leio as palavras que escreveste, mas nao posso mentir-te ao dizer-te que fico triste, contudo também nao me fazem feliz. Sei que ele pensa em ti, que nao lhes sais dda cabeça. posso pareces ingenua, mas só o meu coração sabe o que sofro devido às coisas que sei. Mas nao deixo de gostar de ti, por um lado entendo-te, compreendo o que sentes. Tenta ser feliz ao lado do teu noivo.
Agora falando sendo a Rita. acho que escreveste maravilhosamente bem sobre a Noiva. Gostei imenso aserio =D.
Beijos da tua priminha ( Mulher...Rita Araújo =P. )
Ora...pois que li uma carta escrita pela noiva...bonito e exemplar...
R.
Gostaria de deixar aqui o meu elogio, ao nosso maravilhoso cenário! Todos que o vêem ficam impressionados!
Um beijinho para todos os senhores actores
é verdade esquecime de fazer referência ao cenário ( agora merecia um carolo)... está mt porreiro.
=D =D.
Beijos para todos e muita MERDA
Talvez tenhas plantado a esperança,pois,encontrei a carta!
Sem dúvida que desconheço a tua dor, a tua luta, a paixão que pensei ter desaparecido por não ter dinheiro!
Achas que me casei por orgulho?Com força?Que força e orgulho pode alguém ter, depois de ser rejeitado por não ter terras?Casei-me ferido isso sim.
Provavelmente desistimos os dois porque nos entregámos a outras vidas que não,queremos.
Antes a morte que viver abrasado como vivo!
Não deixo de pensar em ti um minuto e todas as noites monto o cavalo para correr na direcção da tua janela e mirar-te como se fosses quem eras antes.
Amanhã casarás e ao mesmo tempo vais matar-me,teu pai não o fez,mas tu vais fazê-lo,assim que pronunciares o sim.
Se me casei foi para te libertar do que pensei não quereres...agora continuo preso a ti e é a ti que eu devia amar acima de todas as coisas.
Leonardo
tenho 3 coisas pra dizer:
1ª-este diario' esta' bastante bem escrito (adorei!)
2ª-o cenario' esta' lindissimo!
3ª-imensa merda pa todoss! XD
beijinhoss. da lenhadora*
Então diz que é para deixar a minha marca aqui, não é? Está bem... Cá está ela então...
Boa sorte a todos (que eu não sou supersticiosa...).
;)
ó Patricia! está lindo! Tão real, tão profundo! Tão emocionante!!:D
E sim! o cenário está fantastico, alias a peça em geral :P
beijinhos para todos e mta mta [devo dizer?ah que se lixe!] mta MERDA!
Quem fala é a tua sogra.Gostei mt do trabalho que desenvolveste,pois tem que se gostar mt do que se faz para fazer tudo isto,tanto pelo trabalho de pesquisa como o tempo que se gasta.Parabéns,afinal até és um genro porreiro.Beijo.
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